8 de abril de 2010

Carta aberta ao Dep. José Genoíno

Caro Deputado José Genoíno,

De cara, me perdoe pela absoluta falta de respeito às formalidades durante este texto. Faço isso por duas razões.

Primeiro: você é um parlamentar, pago (e muito bem) com o meu, o nosso suado dinheirinho. Logo, "nós, o povo" somos o patrão, e vocês estão aí para, em último caso, atender as nossas vontades. Por isso mesmo, dispensam-se as mesuras exageradas.

Além disso, e apesar de ter um mandato pelo Estado de São Paulo, você é cearense, meu conterrâneo. Conhecemos bem de onde você e sua família vem, o que fizeram e o que fazem. Conhecemos MESMO... Logo, deixemos as frescuras de lado.

Direto ao assunto: você perdeu uma ótima, diria até excelente, chance de ficar caladinho da silva nesse debate sobre o Projeto Ficha Limpa. De todos os membros de sua bancada (e talvez de toda Câmara), você deveria ser dos últimos a se intrometer na discussão. E não me venha com essa conversa fiada de "exercer o mandato popular"... Alguém que está sendo alvo de um processo no STF não deveria nem comparecer ao plenário durante as discussões do projeto. Qualquer coisa que você fizer e/ou disser vai ficar claramente marcado como "legislar em causa própria".

Como se não bastasse, não venha se meter a "botar boneco" com o projeto alegando que ele fere a Constituição, que tolhe direitos, etc. Direito quem tem é o povo de não permitir que um bando de pessoas já condenadas por todo tipo de crime tente conseguir a proteção das imunidades parlamentares e dos privilégios que um mandato proporciona.

Veja bem essa sua declaração: "Essa é uma lei casuística, fere o devido processo legal. É o Judiciário quem vai escolher quem será candidato, que vai tutelar o processo político. Quem tem que tutelar é o povo, é o cidadão, na urna secreta." Deputado, isso é um sofisma sem tamanho. Afinal de contas, o Judiciário é um poder que também representa a vontade do povo. Juízes existem para defender o correto cumprimento da lei e de seu espírito, e com isso proteger a sociedade contra aqueles que não se portam corretamente.

Sinceramente, estou com o saco cheio das hipocrisias de supostos "defensores da democracia". Deputado, a democracia verdadeira abomina a corrupção. Dizer que os fins justificam os meios é algo medieval. E o Brasil merece mais do que isso.

E pra terminar, um conselho: como diria alguém acolá, quando a esperteza é grande demais, ela engole o esperto.

Saudações cearenses.

4 comentários:

nada será como antes disse...

Luiz,

Permita, por favor, alguns reparos.

Não tenho porque defender a palavra de qualquer deputado ou político de carreira.

Por outro lado, conheço bastante o Judiciário para afirmar, com certa tranquilidade, que esse não é um "poder que também representa a vontade do povo". São muitas as chicanas que ocorrem em processos judiciais, justamente no âmbito do poder menos legítimo do trio republicano.

Em 29/09/09 lancei, no meu blog, texto intitulado "Qual é a ficha do Ficha Limpa". Nele estão alguns argumentos que, por coincidência, são semelhantes aos dos opositores do projeto.

Acredito que o cidadão/eleitor não deve ser tutelado e existem diversas maneiras de ampliar transparência e lealdade no ambiente político. Aliás, a inexistência de processos contra qualquer pessoa não garante caráter ou honestidade.

Consciência política não se adquire mediante proibições, cerceamentos e interdições. Seria mais produtivo e isento de terceiras intenções se os organizadores do "Ficha Limpa" se dedicassem à ampliação da cultura política da sociedade.

Luiz disse...

Nada,

Suas posições, defendidas com a elegância habitual, só vem somar ao debate.

Li o seu post, e gostaria de colocar alguns adendos:
- O projeto inicial falava de denúncias ou condenações em 1ª instância. A forma atual, pronta para votação, fala em condenação por órgão colegiado, ou seja, pelo menos uma 2ª instãncia. Só isso já diminui drasticamente o perigo de ocorrerem os problemas que você levantou (denuncismo, perseguição, etc).
- Reconheço os enormes problemas do nosso Judiciário, aceito o fato de ele ser (como você bem citou) o menos representativo dos três poderes republicanos, mas isso não invalida sua utilização para impedir que sinistras figuras almejem um cargo no Legislativo ou no Executivo. Não vejo nisso sinal de autoritarismo, e sim de respeito aos cidadãos honestos.
- Concordo que a ausência de questionamentos judiciais não é prova cabal de lisura, porém o inverso é quase sempre verdadeiro, especialmente se mais de uma instância já posicionou-se. Óbvio que eventuais insatisfeitos continuarão a ter o direito de recorrer às altas cortes, as quais poderão (e deverão) desfazer eventuais equívocos.
- Não vejo intenção de tutela na proposta em questão, e sim uma tentativa de romper com um modo marcadamente retrógrado de fazer política, que tem uma de suas mais conhecidas caras na velha expressão "Roubo, mas faço".
- Concordo 101% com você que a ampliação da cultura política da sociedade seria a solução ideal, e devemos lutar por isso. Mas infelizmente, por hora, temos de procurar mecanismos que impeçam (ou pelo menos dificultem) a perpetuação de práticas danosas.

Quanto ao parlamentar ao qual me dirigi, não creio que ele mereça tratamento mais suave, muito pelo contrário. Imagino que nisso não estamos em disacordo.

Novamente, é um prazer dialogar com você, sempre.

Pax disse...

Concordo com você Luiz. O Nada tem um ponto, claro, mas o próprio processo que levou ao Ficha Limpa é, sim, educação política em si.

Vale ressaltar quantas vezes for necessário que:

1 - Nossa constituição diz que todo poder emana do povo e em seu nome será exercido ou por representantes ou DIRETAMENTE.

2 - O projeto Ficha Limpa é uma das formas legais, constitucionais desse DIRETAMENTE.

3 - Muito mais que isso, esse movimento popular é cada vez mais raro, a sociedade está completamente desmobilizada e um evento como esse deveria ser aplaudidíssimo, muito ao contrário do que os opositores ao projeto fazem.

4 - Sem esquecer a essência da coisa toda: como você bem disse, a sociedade está de saco cheio de tanta corrupção. Quem antes se dizia ilibado e posava de santo, hoje vem com essa palhaçada dos tais fins que justificam os meios. Coisa nenhuma. Seja de que lado for, corrupção destrói o país. Rouba-se, na verdade, a esperança. As pessoas ficam cada vez mais enojadas, se afastam da atividade política, um tremendo perigo. Aí mesmo que certos "alguns" passam a utilizar de peças íntimas como meio de transporte do erário. Dinheiro público não é para andar em cueca de ladrão que tira dinheiro da escola, do hospital e do salário do policial. Dinheiro público é para voltar para o povo e por ele deve ser controlado.

Uma tremenda bola fora essa oposição ao projeto, oposição à uma mobilização popular absolutamente legítima e sintomática de uma insatisfação pra lá de concreta.

Monsores, André disse...

Luiz,

Independente do projeto ficha limpa - seu post; a maneira com que o escreveu e o fato de tê-lo feito com o coração, me dá um baita orgulho por ser seu amigo.

Abraço.